segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Éramos 7 num carro muito doido
Esse texto pode parecer fútil para alguns, mas não é. Se quiser perder seu tempo lendo, você entenderá. Talvez essa tenha sido a forma que encontrei para falar das muitas despedidas que tive em minha vida e, principalmente, no último ano.

A verdade é que me apego a tudo e a todos e dar adeus não é uma tarefa fácil para mim. De uma ideia a um objeto ou a uma pessoa, a única coisa que muda é o quão rápido eu supero essa despedida. Pode ser 5 segundos, 5 minutos, 5 horas, 5 semanas, 5 meses, 5 anos...

Minha última despedida foi o carro da família – faz 1 semana - que ao meu ver possui uma história muito rica porque eu cresci com ele. Não conseguirei transmitir todo o sentimento que tenho por ele e muito menos revelar seus segredos e memórias por completo.

Último dia ao lado do carro mencionado ao longo do texto
Em 1998 minha tia comprou um carro que atendesse não só aos desejos dela como também se ajustasse ao tamanho de nossa família com 7 integrantes. Acabamos com um Caravan da Chrysler, um carro enorme, superconfortável e de 7 lugares. Com pouco esforço, e ainda tendo espaço de sobra, davam 9 pessoas.

Partimos em nossas tradicionais viagens em família agora com muita confusão, amor e espaço para todo mundo. Uma de nossas maiores tradições eram as camisas idênticas para todos: não interessava onde, sempre tirávamos uma foto com nossas blusas. Infelizmente meu avô não aproveitou o carro por muito tempo já que em dezembro de 1998 ele veio a falecer.

Todos fofinhos e com blusas iguais na primeira foto
Os anos se passaram e eu continuei dos 7 aos 24 anos na cozinha do automóvel. A cozinha era o último banco do Caravan e passei grande parte do meu tempo deitada nele dormindo ou no chão refletindo a vida. Se eu não estava dormindo estava fazendo farofa e planejando festas - não tão - surpresas, amigos ocultos e afins.

Lembro de passar pelos amigos do colégio e minha tia dar carona a eles sem menor problema. Bem, ela parava quando já tinha criança demais fazendo barulho. Foi nessa época, eu com meus 8 anos, que comecei o discurso: “Quando a validade do carro acabar você, eu posso ficar com ele?”.

Com o passar dos anos as viagens familiares diminuíram até chegar ao ponto de não mais acontecerem. Minha tia-avó passou a andar com dificuldade e da bengala, a qual ela relutou a usar, ela passou para a cadeira de roda, novamente cheia de implicância, e por fim ficou na cama até falecer em março de 2014.

Minha tia não conseguiu lidar bem e ficou sem falar comigo por um tempo até conseguir se recompor do luto. O carro... Ele se tornou apenas um mero acessório empoeirado na garagem.

Em julho de 2014 mais uma integrante da família acabou deixando esse plano, dessa vez a esposa do meu tio-avô. Vivi muitos momentos de brincadeira com ela.

Ah, o carro... ainda encostado lá e raramente saindo de sua vaga.

Em setembro de 2014 comecei a autoescola porque em algum caso de emergência alguém além de minha tia teria que dirigir o carro. A validade dele já tinha passado e fiquei anos implorando para ela esperar até eu tirar a carteira para trocá-lo. Precisava dirigir o carro da minha infância ao menos uma vez.

O carro dessas fotos é apenas o carro que a família teve até 97. Fomos felizes nele também. Eu vivia na mala.
No começo de novembro de 2014 minha vó, depois de 47 anos no Rio, decidiu voltar para Teresina, no Piauí. Acho que ela está bem apesar de ter ido arrumar confusão com a família dela no outro lado do Brasil.

Enquanto isso, eu me esforcei e passei de primeira na prova da autoescola e em dezembro peguei minha Carteira de Habilitação. Fiquei empolgada para dirigir o carro da minha tia, mas travei ao realizar que aprendi num Fox manual e compacto e eu teria que dirigir um carro gigante e automático. Não fiz prova para isso!

Deu tudo certo. Foi lindo, mas minha tia dirigindo ele era ainda melhor. Dirigi uma segunda vez e nunca mais toquei nele. Minha tia mesmo não queria mais sair nele, ela não se sentia mais confiante no carro, como se uma energia ruim estivesse ali.

Alguns meses depois, precisamente semana passada, vi o carro que me deu inúmeras memórias indo embora. Aos mesmo tempo em que comecei a ver minha família diminuindo, eu percebi que me afastava dele.

Uma família zoeira e muito feliz
Parece que o símbolo de união da minha família como 7 integrantes já não tinha mais sentido para estar entre nós. Porque foi isso que senti. A despedida desse carro nada mais é que uma ênfase no passar do tempo e na desintegração da família que eu costumo chamar de minha.

sexta-feira, 17 de abril de 2015

Desabafo de uma junkie


Pensei mais do que deveria em como começar esse texto. Eu acho que depois que você passa 14 anos pensando nisso, não importa mais como começar e sim que você apenas consiga escrevê-lo. 

Problemas no paraíso

Eu tenho um problema. Queria poder escrever que uso drogas abusivamente - na verdade não queria, muitos sofrem por causa disso e não é uma brincadeira - porque a sociedade está mais 'preparada' a ajudar esse tipo de situação do que a minha, mas não é o caso. 

Pode não parecer nada, mas uma noite de insônia para mim é um prato cheio de tortura, autocontrole e reflexão extrema da vida de tal forma que nenhum ser humano deveria fazer de uma vez só. Sério, façam isso apenas em doses homeopáticas, jamais pensem tudo ao mesmo tempo, dá uma sobrecarga desagradável.

O dia seguinte dessa noite sem dormir se reflete mais rápido do gosto de processar. É um lixo para mim, resistir à tentação de fazer mais, sentir a adrenalina correndo pelas minhas veias, lidar com a hiperatividade, e perceber que nada mais sou além de outra junkie numa geração cheia de pessoas viciadas em suas próprias drogas: trabalho, estudo, sexo, jogos, bebidas, tecnologia.

Aceito o mais fácil

Não sou melhor, não sou pior que ninguém e quero que me digam quem tem o poder de me julgar. Estariam certas as crianças do meu colégio que se achavam melhor que os outros e por isso viam como o bullying a forma certa de extravasar para longe de seus próprios problemas pessoais?

E até as pessoas que não sabem lidar com o diferente em seu dia a dia e consequentemente analisam os outros de cima a baixo criando suas próprias teorias? Ou estamos um pouco longe da tal mensagem que o Glee tentou passar ou as pessoas querem aceitar apenas o que elas colocaram na cota delas. 

Mascarando a depressão

Mas sei lá, eu já tentei parar tantas vezes e fracassei tantas quantas tentei que a máxima 'tudo depende da minha própria vontade' já ficou saturada. Tive muitos altos e baixos, tanto que uma época tenebrosa é conhecida por mim como os Tempos Escuros. Acho que nunca fui tão falsa comigo e com os outros quanto nessa época.

As pessoas não entendem hoje em dia, imagine então há uns 8 anos, quando eu falo que tenho depressão. (Vamos abrir um parênteses aqui: Olá, só porque tenho não preciso ficar anunciando e me comportando da forma que você espera). Eu apenas era boa - ou eu achava que era - em colocar uma máscara e fingir que estava tudo bem, tudo lindo, feliz e que nada no mundo podia acabar com meu sorriso amarelinho. Foi nessa época que criei uma armadura e comecei a passar a imagem de durona - ainda faço isso -, mas quem me conhece sabe que nem sou.

Não estava bem, era ruim, muito complicado, na verdade, porque quando eu voltava para casa eu já era uma pessoa diferente. Tentei me matar três vezes, deixei minha família em pânico. Não queria chamar atenção como alguns adoram falar, apenas terminar com meu problema da forma que eu achava que ia dar paz para mim e a minha família. Não deu certo - estou aqui criando coragem e escrevendo esse desabafo - e eu cresci para nunca mais pensar em tirar a minha vida. Coloquei em minha cabeça que ou eu conviveria com meu problema ou tentaria resolvê-lo. Morrer significaria que eu estava me entregando de fato a ele.

Sempre tive ajuda de psicólogos, psicanalistas e psiquiatras. Mas nunca consegui ser 100% honesta sobre tudo, precisava embelezar algumas coisas. Meu grande erro, claro. Nunca consegui me abrir por completo sobre isso com meu amigos, não queria - não quero, não gosto e me sinto mal - em incomoda-los com meus problemas. Não falo com minha família sobre o assunto, quando você passa sua adolescência ouvindo: "Você faz isso porque gosta. Por que você não para com isso, não vê que eu estou morrendo?", não tem muita brecha ai para diálogo sincero que não acontecia nem em consultório.

Agora vai!

Foi quando ano passado eu, acidentalmente, encontrei uma fonte de ajuda forte. Tudo bem que entrei anonimamente, ninguém exige que você diga quem é. E percebi que do outro lado do mundo existem pessoas passando pelas mesmas situações que eu, que de fato não estou sozinha com isso, e que vivemos coisas parecidas. E tudo foi lindo, mágico, me vi em outros, comecei tantas coisas para melhorar meu vício, meu transtorno obsessivo compulsivo, mas abandonei. Tenho tendência a fazer isso com as coisas.

E ontem sofri a maior recaída nos últimos 4 anos. Foi então que hoje, as 7:15 da manhã no meio do metrô decidi escrever sobre. Está super divertido as pessoas me encarando enquanto choro silenciosamente e digito incontrolavelmente esse texto. 

E por que eu decidi falar sobre?

Isso está me consumindo desde os meus 10 anos, ou seja, ano que vem ele já pode ganhar uma festa de 15 anos que não tenho vontade de bancar, e acredito que todos tenham os seus problemas da forma que eles se apresentem e pelo tempo que eles decidem permanecer.

É difícil encontrar coragem para desabafar sobre as coisas ruins que enfrentamos, mas eu não acho justo que as pessoas tenham que lidar com elas sozinhas. Não sei porque demorei 14 anos para perceber isso, para os outros podem levar menos tempo ou mais, não sei, não interessa. 

Só acho importante que você tente se aceitar, mesmo quando o mundo tenta fazer de tudo para te colocar para baixo, você pode lutar suas próprias batalhas, mas não precisa fazer isso só. Definitivamente existem pessoas do seu lado que estão dispostas a te ouvir e a te ajudar da forma que é possível para elas. 

Eu preciso de ajuda, sempre precisei, mas nunca tive coragem de gritar isso. Ainda não tenho forças para dizer ao mundo o que é, veja que comentei sobre conversar com os amigos, o mundo não precisa saber. Já consegui desabafar sobre ter um problema. Vamos tentar dar um passo de cada vez, que tal?